TDICs: "Melhoria automática"?


     Muito se fala do uso da tecnologia como ferramenta que incrementa o ensino, de modo que melhora a aprendizagem em sala de aula. Com pensamentos desse tipo, muitos professores introduzem em sala de aula diversos recursos tecnológicos, principalmente audiovisuais, esperando a tal “melhoria automática”. Vamos falar sobre isso.

É certo que tecnologias podem melhorar o processo de ensino-aprendizagem. Porém, não é a tecnologia em si que melhora alguma coisa. Se você coloca uma imagem para ser projetada em uma tela, não está fazendo nada mais do que o que livros didáticos já o fazem há décadas… com uma pequena diferença: a imagem que estava na carteira do aluno agora está com o professor. Caso o aluno queira observar melhor a imagem, ir em outra e retornar a ela para observar outra vez, não pode. Por isso o uso da tecnologia deve ser cautelosa. Ferramentas diferentes para o ensino são sempre bem-vindas, mas o que de fato é crucial para o processo de ensino-aprendizagem é o método. Não é “o que” você usa no seu ensino, é “como” você usa.

     A tecnologia pode se tornar a variável de um problema, em vez de solução. E o problema aumenta quando esse tipo de visão sai dos limites de atuação educador, envolvendo toda política de ensino. Não é incomum vermos comentários ruins sobre escolas que não tem as novas TDICs. E quando a administração das escolas compartilham do mesmo comentário, investem tudo em tecnologias, faz cursos extensivos enormes para os educadores: Porém nada disso tem qualquer conexão, de fato, com o ensino. O ideal é começar mudando o currículo na formação dos educadores, e que nesse currículo seja perceptível as possibilidades e impossibilidades com o uso das TDICs. Mudar a infraestrutura da escola, e oferecer alguns cursos de capacitação nem sempre vão ajudar em algo. Cabe salientar que esse post não é contra o uso das TDICs, do qual eu mesmo faço, mas sim contra o uso descabido, que vê as TDICs como ferramentas primordiais para uma nova educação. A nova forma de fazer educação passa por diversas variáveis, que compõem metodologias ativas de ensino -- "com", mas não "para" ou com "base em" -- uso das TDICs.

Pulita e Santos (2016), citando Pretto e Pinto (2006), reafirma que “é urgente a ‘demanda de novas educações, no plural’ e que não se trata mais apenas da apropriação das tecnologias, uma vez que essas, por si só, nada mudam, mas a questão é verificar suas potencialidades e a mudança das articulações entre sujeito e construção de conhecimentos, o que impacta diretamente a lógica escolar tradicional”. Conforme dito pelos autores citados, deve-se verificar se as tecnologias podem, e o quanto podem, atingir “novas educações, no plural”. É dever do educador observar as necessidades de toda classe e de cada aluno. Cada aluno tem suas habilidades, formas diferentes de aprender, e formas diferentes de encarar as tecnologias. Talvez seja muito mais interessante para determinada classe usar o quadro e giz do que um recurso multimídia.

Às vezes nos apegamos tanto em querer usar as novas TDICs, que não percebemos as possibilidades diversas e simples que não precisam do uso delas. Da mesma forma, também acabamos por inibir habilidades dos alunos em materiais “tradicionais”.
Por exemplo: um estudante tem grande habilidade de desenhar. O educador, querendo usar um recurso tecnológico mais moderno, adquire uma mesa digitalizadora, das melhores que tenha no mercado. O aluno não consegue manusear a mesa, nem o educador, o computador não suporta bem a tecnologia, e o processo de ensino-aprendizagem perde totalmente o potencial. Neste exemplo fictício, o educador soube perceber a habilidade e necessidade do aluno, mas não soube usar a melhor ferramenta para aproveitar a situação. O custo pela mesa poderia ter sido investido em materiais simples de desenho, que poderia ser usado por mais alunos simultaneamente e sem as dificuldades tecnológicas. Essa troca de papel físico por mesa digital, foi apenas uma mudança de aparência, não de fato de melhoria pedagógica. Esse tipo de mudança é chamado de “inovação conservadora” por Cysneiros (1999). No caso específico, a mudança de aparência acabou prejudicando o ensino. Seria melhor, nesse caso, ensinar pelos meios tradicionais, que não só desenvolve técnicas de desenho como também desenvolve a aprendizagem sobre os diversos materiais que podem ser usados (quais lápis, quais pincéis, quais papéis etc.).

Cysneiros também da falta de orientação dos educadores. Nas TDICs isso é muito comum. Não só pela falta de preparo do educador como também a falta de contato que algumas tecnologias podem causar. Por exemplo, se um educador propõe uma pesquisa usando a internet para ser feita em casa, como ele vai participar, de forma mediativa, dessa pesquisa? Existe formas de haver essa participação, que podem ser pensadas. Mas a princípio, deixar que use a tecnologia em casa irá diminuir o contato do educador com o educando, prejudicando o ensino. Por isso, mais uma vez, a tecnologia como ferramenta de ensino não melhora o ensino: A tecnologia deve estar dentro de uma metodologia muito bem pensada conforme "demanda" da turma. Nesse exemplo da pesquisa na internet, o professor pode sugerir aos estudantes compartilhar com ele registros da pesquisa ao longo do trabalho, de forma que o professor medeie essa pesquisa e a avalie durante todo processo.

É tudo uma questão de escolhas… e o educador deve saber fazer essas escolhas.



PULITA, Edemir. SANTOS, Gilberto. As (des)conexões entre a educação e a sociedade: quando e como a escola entrará na era digital?. Revista Tecnologias na Educação, 2016.
CYSNEIROS, Paulo. NOVAS TECNOLOGIAS NA SALA DE AULA: MELHORIA DO ENSINO OU INOVAÇÃO CONSERVADORA?. Informática Educativa, 1999.

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